Ontem ao chegar à escola que leciono fui recebida, na sala
dos professores, com críticas e cobranças por ter optado em dar as aulas do dia
aos alunos que haviam ido para a escola. Ainda tentei explicar o que me
motivava, mas percebi que não adiantava argumentar. No entanto o mal-estar
ficou em mim e depois de muito refletir resolvi escrever este texto e divulgá-lo
para que possa ser criticada e refletir em conjunto com amigos e colegas de
profissão.
Estudei no Pedro II, fiz minha graduação na UFRJ e passei
por inúmeras greves quando era aluna e sei do impacto dessas greves na minha
formação. Em uma das mais longas, a paralisação dos professores da UFRJ que
durou quase cinco meses no final do governo FHC, fez com que os alunos
perdessem o semestre, mas mesmo assim, nós alunos da graduação, apoiamos o
movimento, mesmo ele não tendo sido estendido para os programas de
pós-graduação. Lembro que a imprensa nem sequer mencionava a greve e as reivindicações
dos professores. Enviei uma carta ao Globo apoiando e questionando a ausência do
fato no jornal, e eles pelo menos publicaram alguns trechos da carta, mas nenhuma discussão foi colocada em pauta. A
greve acabou, os professores não tiveram suas reivindicações atendidas, tiveram
descontos em seus salários e voltamos todos para a sala de aula com uma grande
sensação de derrota.
Claro que sou a favor do movimento dos professores. Sei exatamente
o quanto somos desvalorizados financeira e moralmente. Concordo com a
necessidade de melhorias salariais; com o direito de 1/3 do nosso tempo para
planejamento a ser realizado em casa e não obrigados a permanecer na escola; concordo
com a necessidade de melhorias nas condições físicas e de infra-estruturas nas
escolas públicas, pois estamos há anos luz do que seria adequado; e defendo a
melhoria do programa de premiação por meritocracia.
Mas não concordo com o pensamento de que a única forma de reivindicarmos
nossos direitos é a paralisação das aulas. Há pelo menos vinte anos vejo o
movimento dos professores lutando por melhorias através de paralisações e, sinceramente,
não podemos dizer que esta estratégia venha dando bons resultados. Pelo contrário
até, penso que tal atitude desvaloriza o nosso trabalho e nos coloca contra a
sociedade. Tenho certeza que temos outras maneiras de reivindicar através de
ações que serão mais impactantes aos gestores e políticos e menos aos nossos
alunos.
Penso que não podemos ver nosso trabalho como uma prestação
de serviço qualquer. Trabalhamos com educação, com a formação de pessoas e o
tempo perdido não será recuperado e assim formaremos pessoas com alta defasagem
de aprendizado e conteúdo. Assim, deixar de dar aulas faz com que abandonemos
as nossas responsabilidades.
Penso também que estou errada em tomar uma atitude individual,
pois a categoria decidiu em assembleia a paralisação, mas vou confessar, esse
sindicato não me representa. Sou obrigada a pagar um dia de meu salário como
taxa de adesão/permanência, sei lá o quê, mas não me vejo representada ali.
Vejo um sindicato que se posiciona com ideologias político-partidárias e que
não reconhece as melhorias reais conquistadas, radicalizando sempre em suas
posturas e negociações.
É preciso também assumir que a sociedade abandonou a
educação e falo isso não pensando apenas
nos políticos e gestores da área. Fala isso não apenas me referindo as famílias
carentes que não conseguem nem dimensionar o quanto o estudo pode melhorar o
futuro de seus filhos. Fala isso não apenas em relação à escola pública, mas, sobretudo,
à escola particular. Conheço casos de escolas caríssimas onde os pais delegam a
responsabilidade dos estudos de seus filhos para os professores. E essas crianças,
apesar de ricas e bem vestidas são no fundo crianças abandonadas na escola, que
não tem pai e mãe presentes, que o professor é tratado como um funcionário da família
e quando ocorre algo fora do desejado, elas reclamam e cobram na direção da escola
a mudança do professor, que é aceita pela escola, pois a instituição não pode
perder aquela mensalidade.
Precisamos definitivamente rever o que vamos fazer com a
educação. Penso que o modelo de educação atual precisa se atualizar. Temos professores
que ainda não perceberam o quanto é importante motivar e modernizar o ensino e
não apenas oprimir e mandar o aluno ouvir, decorar e calar-se. No fundo precisamos
de uma revolução, mas não sei como fazê-la.
Não quero que meus colegas aceitem ou entendam a minha opinião,
apenas peço que a respeitem, pois eu também tenho o direito de não parar.